quinta-feira, julho 17, 2025
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Reforma tributária e aumento da litigiosidade

Já há propostas em discussão para mitigar a sobrecarga do Judiciário

reforma tributária, aprovada por meio da Emenda Constitucional 132/2023, cujo principal objetivo envolve a simplificação da tributação sobre o consumo, representa uma mudança estrutural significativa no sistema tributário brasileiro. A partir da implementação das novas diretrizes, é sabido, haverá a extinção de cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) e a criação de três novos (CBS, IBS e IS).

Como é natural, diante da magnitude das alterações introduzidas, julgou-se necessário estipular um período de transição, compreendido entre os anos de 2026 e 2033, durante o qual coexistirão o regime tributário atualmente vigente e o novo modelo. Tal fase transitória tem como finalidade a implementação gradual das novas diretrizes, permitindo ainda a realização de ajustes normativos que se revelem relevantes na prática.

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A despeito do claro intuito de tal medida em tornar menos impactante a todos a aplicação do novo regramento tributário nacional, é certo que a sobreposição de regimes tende, ao menos inicialmente, a acentuar ainda mais a complexidade da tributação, circunstância que certamente ensejará o surgimento de múltiplas controvérsias fiscais.

Além disso, a mudança de diretrizes consolidadas ao longo do tempo tende também a suscitar novos debates, derivados de interpretações divergentes, que ainda precisarão ser pacificados antes que o sistema se torne, de fato, mais simples.

Dessa forma, considerando a complexidade inerente à transição de um regime já consolidado para um novo regime, é razoável esperar um aumento no volume de demandas judiciais relacionadas à interpretação e aplicação das novas regras. E, naturalmente, surge a preocupação com a capacidade do Judiciário de atender com celeridade e eficiência as demandas que inevitavelmente advirão desse processo.

Fato é que a seara tributária, mesmo antes da reforma do sistema legislativo respectivo, há muito constitui grande desafio aos órgãos judicantes, estimulando a realização de estudos e a expedição de regras que combatam a sobrecarga verificada e a dificuldade em se dar vazão aos litígios surgidos em torno.

Como exemplos temos o Diagnóstico do Contencioso Judicial Tributário Brasileiro, ampla pesquisa produzida pelo Insper por demanda do Conselho Nacional de Justiça, em 2022, e a Resolução CNJ 471, desse mesmo ano, que disciplinou a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado à Alta Litigiosidade do Contencioso Tributário, em ato que reconheceu ser esse contencioso, em nosso país, “caracterizado pelo elevado número de processos tributários administrativos e judiciais pendentes de julgamento que culminam em uma dificuldade intransponível na aplicação do princípio constitucional da justiça efetiva e celeridade na decisão”.

Considerando tal quadro, e assim também a perspectiva de um expressivo aumento na litigiosidade no futuro próximo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também promoveu estudo técnico mais recentemente, voltado à análise dos potenciais impactos da nova estrutura tributária sobre o Poder Judiciário. Os resultados dos estudos foram divulgados por meio da Portaria STJ/GP 458/2024 e a análise concentrou-se especialmente nas atividades jurisdicionais exercidas pelo próprio STJ e pela Justiça Federal.

A primeira preocupação abordada no relatório tem relação com a escassez de regulamentação específica sobre a integração do contencioso da CBS, de competência da União, e do IBS, de competência compartilhada entre estados, Distrito Federal e municípios.

A lacuna normativa levanta questionamentos relevantes quanto à coordenação entre os entes federativos na cobrança e execução dos créditos tributários decorrentes de um mesmo fato gerador. Isso porque existe o risco que tal enseje múltiplas execuções fiscais, promovidas individualmente por cada um dos sujeitos ativos da relação tributária (União, estado e município).

Além disso, o contribuinte que pretenda obter provimento judicial que declare a inexistência de relação jurídico-tributária relativa a determinado tributo poderá se deparar com a multiplicidade de entes federativos legitimados para a sua exigência. Nessa hipótese, será necessário optar por direcionar a demanda contra um deles ou, alternativamente, contra todos simultaneamente.

Nesse contexto, surge a legítima preocupação de que o volume de contencioso tributário possa, ao menos, triplicar. Isso tendo em vista que, além das controvérsias inerentes à aplicação de novas diretrizes, há o potencial de que os tribunais sejam demandados para apreciar até três execuções fiscais distintas relativas a um mesmo fato gerador.

Tal cenário impõe um ônus significativo ao Judiciário, tanto em termos de volume processual quanto de complexidade na uniformização da jurisprudência. Há, ainda, o risco da prolação de decisões conflitantes por magistrados federais e estaduais em relação a um mesmo fato gerador, o que contribui para um cenário de insegurança jurídica.

Em adição, o relatório elaborado pelo STJ indica que o inadimplemento deve gerar dívidas fiscais mais relevantes no novo modelo, que aumentam a probabilidade de que os entes federativos tenham interesse na execução judicial do crédito tributário.

Dessa maneira, apesar de a reforma tributária ter como objetivo central simplificar a tributação, a alta litigiosidade envolvendo questões tributárias tende a persistir – ao menos, no curto e no médio prazos –, com a possibilidade tangível de se multiplicar ao longo dos próximos anos, conforme sinalizado pelo STJ.

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Já há propostas em discussão para mitigar a sobrecarga do Judiciário, como a possibilidade de exigência de prévio requerimento administrativo, a criação de um Tribunal Federal de composição mista (juízes federais e estaduais) para concentração de processos relativos ao IBS e à CBS e a criação de ações de competência originária do STJ, como forma de reduzir divergências jurisprudenciais sobre o tema.

O STJ destaca que a proposta mais eficiente e tecnicamente simples gira em torno da unificação da atividade de cobrança do IBS e da CBS, que ainda precisa ser devidamente regulamentada. Diante dessa perspectiva, é essencial fomentar o debate técnico e institucional em torno dos riscos já identificados, de modo a antecipar regulamentação capaz de mitigar os efeitos negativos da reforma tributária.

Outro ponto que merece atenção neste momento é o da permanente busca de incentivos com vistas à maior efetividade dos processos ou mesmo a solução amigável de conflitos, que tem nos institutos do negócio jurídico processual e da transação tributária exemplos incontestes dos benefícios de medidas da espécie.

Por fim, é positivo constatar que o Judiciário já vem se antecipando aos principais desafios por meio da realização de estudos, além da proposição de soluções voltadas a assegurar que o sistema de justiça esteja devidamente equipado para lidar com os impactos da implementação do novo modelo.

Fonte: JOTA

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